Política colocando umedimento na febre da Copa do Mundo no Brasil

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A cada quatro anos, há uma explosão de verde e amarelo no bairro de Júlio César Freitas, pois os moradores locais cobrem as ruas com as cores da bandeira do Brasil.

Mas este ano, Freitas se sentiu competitivo para acrescentar uma explicação ao lado do mar de decorações fora da loja de materiais de construção de sua família: “Não é política, é a Copa do Mundo”.

O Brasil, que é famoso por sua paixão pelo futebol, já ganhou cinco vezes a Copa do Mundo. Mas este ano, os sinais da febre do futebol assumiram um significado diferente.

Lutando para ganhar a reeleição em 30 de outubro contra o veterano esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente da extrema-direita Jair Bolsonaro adotou a bandeira e a camisa da seleção nacional de futebol como símbolos de sua própria bandeira.

Bolsonaro esporta regularmente as cores da bandeira, seus comícios são encharcados de amarelo e verde, e ele pediu aos torcedores que vestissem a camisa icônica da seleção nacional de futebol para votar na primeira rodada das eleições de 2 de outubro, na qual ele terminou a cinco pontos percentuais atrás de Lula.

Com os brasileiros amargamente divididos pelas eleições, o amarelo e o verde se tornaram politizados – às vezes amortecendo as exibições externas da febre da Copa do Mundo no Brasil, apesar de a equipe se dirigir ao Qatar como a favorita antes do pontapé inicial do dia 20 de novembro.

O mal-estar é visível no bairro de Freitas, Caicara, na cidade do sudeste de Belo Horizonte.

A cidade organiza um concurso de decoração para cada Copa do Mundo.

Freitas, cuja família participa desde 1994, diz que houve reações negativas este ano na comunidade politicamente dividida após terem pendurado suas decorações há duas semanas – fileiras sobre fileiras de mini bandeiras triangulares amarradas do outro lado da rua.

Dois dias depois, eles acrescentaram a placa acima mencionada.

“Infelizmente, a Copa do Mundo coincidiu com as eleições deste ano. Tive que colocar o cartaz para que as pessoas soubessem que as decorações não são para apoiar nenhum candidato”, diz Freitas, 26 anos.

“Eu podia ver que as pessoas estavam chateadas”, diz ele.

Mas depois de acrescentar a placa, “as pessoas que tinham ficado zangadas conosco por causa disso começaram a nos elogiar”.

Em outros lugares, muitos restaurantes e bares adiaram a colocação de suas habituais decorações temáticas para a Copa do Mundo.

“Todos estão no limite”. Como empresário, não quero nenhum problema”, disse Decio Lemos, dono de um bar em São Paulo, ao jornal O Globo.

“Compramos camisetas brasileiras para os funcionários usarem, mas ainda não vamos começar a usá-las”.

A bandeira brasileira e a camisa Selecao se tornaram símbolos conservadores difundidos pela primeira vez em 2015, durante protestos contra a ex-presidente de esquerda Dilma Rousseff, a sucessora escolhida a dedo de Lula.

A tendência só aumentou sob o comando de Bolsonaro, apesar dos esforços da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para manter a camisa apolítica.

Antes da eleição do primeiro turno, a Nike, que patrocina a Seleção, proibiu os compradores on-line de encomendar camisetas personalizadas do Brasil com os nomes dos candidatos na parte de trás.

“As pessoas estão se arrastando (a camisa) para a política. Isso está nos fazendo perder a identidade da camisa e da bandeira”, disseram recentemente Richarlison, atacante do Tottenham Hotspur e do Brasil.

Muitos brasileiros têm levado a manter suas camisas amarelas no armário, por medo de serem molestados ou atacados.

Para os apoiadores Bolsonaro, porém, é um símbolo orgulhoso de seu lema: “Nossa bandeira nunca será vermelha” – a cor do Partido dos Trabalhadores de Lula.

Lula, por sua vez, prometeu “resgatar” a bandeira e a camisa do “aquele fascista” Bolsonaro – um grito de rali apoiado por pessoas como a superestrela pop Anitta.

Mas, à parte as lembranças brilhantes de Pelé, Ronaldo e Ronaldinho, o interesse dos brasileiros pela equipe vem declinando há anos.

Cinquenta e um por cento dizem não estar interessados na Copa do Mundo, de acordo com uma pesquisa de agosto. A venda de ingressos e o público de TV para os jogos da equipe também vem diminuindo.

Especialistas dizem que a politização da camisa desempenha um papel, mas também apontam a humilhante eliminação por 7-1 da equipe pela Alemanha em casa na Copa do Mundo de 2014 e o fato de tantos jovens talentos partirem para a Europa, diminuindo a conexão com os torcedores em casa.

Mas o historiador esportivo João Malaia prevê que a negatividade e as divisões se dissiparão quando o torneio começar.

“Quando chegar a hora do pontapé inicial, a maioria das pessoas vai esquecer tudo isso”, diz ele.

“Eles vão querer que o Brasil vença”.